quinta-feira, 25 de março de 2010

Uma carta, depois do perda

[...]

Não sei até quando suportarei essa, como defini agora, "intransponível solidão".

Acabarei por me apaixonar pela luxúria... Talvez me torne um apreciador do sexo casual, ou de algo do tipo. De certo, como um alguém afetado, estranho... Assim vêem meus colegas de trabalho o meu beber (só bebo de vez em quando, e sempre coisa forte. tenho gosto pela vodka).

Não sei... Meu desejo pelo sublime é muito forte, muito natural, muito amado. Aqui, com todo meu sofrimento, sinto sensações indescritíveis, momentos muito caros... É o benefício de liberar o "monstro"; embora o meu "monstro" não seja um desejo, porém uma atitude. Monstro? Mui amado é o meu Dragão!

Em algum momento deixarei de suportar essa vida. Deixarei de tentar encontrar as minhas pessoas, ou ver companhia nos "outros" (que não são outros, porém mais simplórios, ou, sendo justo, mais satisfeitos).

Quero ir até o limite dessa fantasia chamada viver. Ir o mais alto possível, assim estou satisfeito... É um sofrimento profundo e uma alegria profunda ao mesmo tempo. Tens pena e admiração? Tenhas só um pouco de ousadia e honrará esse pateta sentimental que vos fala. Se é mesmo do seu agrado viver assim... Deixe pelo menos esse espírito criativo aflorar um pouco. "Monstro", ora pois. Entenda: O instinto sexual está diretamente ligado a tudo isso: Criatividade, desejo de gerar, de fazer. Tudo próximo, junto.

Seja a psicóloga! Ora, explica ao mundo a minha virtude e a minha desgraça, a mesma de tantos outros espíritos excepcionais, diferenciados!

É um erro terrível se fazer de fraco em um relacionamento, mas desde o início percebi que você estava pouco disposta aos meus "pensamentos eruditos", como julgas. Quero ser amigo e muito mais, mas posso ser apenas o amigo...

O Eremita. O conselheiro velho, corcunda, aquele em quem podemos falar daqueles temas eruditos...

Tão alto, tão pronto para resolver os problemas do mundo, tão incapaz de conseguir um único beijo de rapariga!

rs

Aprenda um segredo meu: Gosto de rir de mim mesmo.

Mesmo se não fosse o "monstro", Bela, as coisas não poderiam ser diferentes. Existe uma sincronicidade aqui. É o mesmo padrão. A minha solidão Bia, não é uma solidão feita por um âmbito social opressor ou coisa parecida, minha infância foi feliz, satisfatória. Eu não me sinto ameaçado, ou diminuído, e de modo algum gostaria de estar no grupo... Fui um adolescente calado, mas satisfeito consigo.

... Ouvia você, mas com resistência, sabes. Indeciso, temeroso, com muita dor. Problemas financeiros, familiares, crise forte de minha própria vocação... Encontrar no âmbito acadêmico essa covardia, esse dogmatismo, essa anemia de entusiasmo e caráter. Tudo isso me desmoronou. Desde os meus 19 anos entrei em um processo de insatisfação interna, culminante no meu desejo de suicídio.

Medo, eu gero medo nas pessoas. Desconfiança, "pé-atrás". Tenho um temperamento acelerado, ousado, intrépido e, ao mesmo tempo, uma autosatisfação, uma fluidez de si mesmo, uma facilidade para me impor em uma questão do meu interesse. Tudo isso gera medo e inveja (um não está muito distante do outro). Como resposta, sinto-me afastado, distante, longe demais para desejar o que desejam, ou buscar o que buscam. De certa forma, em todas as formas, desmotivado. Porém, meu fracasso no amor vem de outra linha... Vem da minha natureza ígnea. Não posso meramente desejar uma mulher, não quero apenas ter mulheres e andar por aí "curtindo a vida", isso não é minha natureza. Sempre procurei algo de maravilhoso, de sublime, quiçá, irreal. Não me bastava alguém, precisaria ser O alguém, alguém que pudesse suportar meu espírito, alguém que pudesse partilhar comigo dos meus voos... É pedir muito, ou pedir para a pessoa errada...

"Talvez eu goste de ser solitário". Disse, no nosso encontro. Mas a solidão não é natural, o que queria dizer era: "Quero estar com pessoas, mas não essas pessoas, porém, as minhas pessoas, as pessoas do meu cerne".

Eu conheço abismos mais profundos do que você, Bela, talvez por isso seja mais distante, e mais escuro. Esse mundo, amiga amada que não me ama (rs), não é o meu mundo. O meu temperamento pede mais, pede muito... E é assim que sou, assim sou. Assim torno-me quem sou.

Newton era exatamente assim, Nietzsche... Estou sendo pretencioso? Ora, quantos não existem assim, de tempos em tempos? Ter fama ou não, estar certo ou não... Que se dá!

Sim, quero a sociedade, mas quero afastado. Farei o possível, pelo amor a espécie, mas não quero comprometer meu próprio ser. A infelicidade de deixar de ser o que sou, é maior do que a infelicidade de uma intransponível solidão.

... Nem mesmo aquele doce foco de luz! Uma moça sublime, Bela, você nem pode imaginar!

Entendo bem você, e estou querendo me fazer entendido.

[...]

Você não me deve nada.

Sabe, hoje vivenciei um momento que ainda fala no meu ser...

Hoje, trabalhando no posto de gasolina, conheci um taxista. Moreno, meia idade, bom humor. Começamos uma conversa e ele me contou sua vida:

"Passou 6 anos na Academia, depois, resolver largar tudo e se tornar taxista. Era um jovem talento, uma promessa, e no entanto, largou tudo"

Falava de seu início de carreira, de suas aventuras pelas ruas... Com entusiasmo, com serenidade até.

Tudo aquilo falou comigo com uma força imensa.

... Sabe, preciso discordar de um ponto... Eu não quero mudar. É algo que esse taxista confirmou, no meu coração. Eu já estou no caminho certo, no meu caminho.

Eu nunca escondi meu interesse por você, você nunca escondeu sua pouca inclinação para ele. Não é primeira, nem a segunda, nem a terceira vez... Mas é preciso ser assim. É necessário. E eu entendo esse comportamento, o seu e o de todas as outras. Eu só não posso declinar meu espírito... Iria contra a minha natureza.



OBS: Cuide bem do meu Stendhal, é o meu único exemplar. Ainda estou com sua Florberta aqui.

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