quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Liber Monstrorum - Sereia


Eu sempre acordo assim... Sem rumo. Desesperada. Apressada. Eu nunca encontro nada. Corro pela casa, pegando e jogando coisas. Eu me arrumo, não me arrumo, não me entendo. Visto. Preciso sair...

Meu dia é a noite. Desço ao palco mal iluminado de uma cidadela qualquer. Velhos e plácidos cantarolam, gesticulam e berram. Alguns comentam meu nome, dizem coisas que não fizeram ou não teriam carisma para conseguir. Eu sou itinerante, uma voz para agradar cantando músicas de qualidade duvidosa e alguns poucos clássicos da MPB, de buraco quente em buraco quente. Mas estou cansada.

"Durante muito tempo vaguei esperando algum amanhecer dourado; alguma extraordinária sorte - e que me elevasse. Quando menina, não sonhei com o principe alvo - sonhei por um cavalo branco". Faz parte de uma composição minha... Canto, entre uma canção e outra. Estou cansada. Ficamos, eu e minha banda, Michel, 3 ou 4 meses em uma cidade. Geralmente na Costa. Vamos para São Paulo, e voltamos. Região dos Lagos, Nordeste, Sul, Espírito Santo. As pessoas gostam de música ao vivo por motivos que eu nunca compreendi. Detesto ouvir gente falando enquanto como:

"As pessoas frequentam bares para falar e ouvir falar". Diz Michel.

Michel é um amigo ou um pouco mais. Toca baixo e violão. Não é bom, mas é leal e sincero sem ser rude (tipo difícil). Eu canto e toco violão. Já andei sozinha, em grupos maiores... Mudamos vagarosamente e estou pensando em dar um tempo. Não estou me sentindo bem... E me pergunto qual será a reação de Michel.

Vejo uma pequena multidão em suave embriaguez. Moços e moças, caminham entre as mesas cambaleando, levantam os braços, gritam e gingam, falam, e outros escutam. Alguns balbuciam a música comigo. Alguns, reclamam da minha voz.

Mas canto. E canto.




FOTO: Fascinação da Iara, de Teodoro Braga (1929)

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