segunda-feira, 6 de junho de 2011

João Pestana


Taciturno e sorrateiro, noturno.
Face oculta, sutil, leve como brisa, caminha pela penumbra.
Você não vê, sente, não sente, adentra, por devaneios, intensos, obscuros passos, sentinela dos prostrados.
Dos olhos negros, profundos, intensos, do todo e por cantos. Areia cai.
Contempla almas, latentes, contemplador no escuro... Você também pode vê-las... Veja.

Da janela adereçada, observa leviano o repousar da jovem.
Moça meiga, delicada, pode vê-la? Vê a pureza?
Não, olhos maus, você precisa contemplar... Não veja, contemple... Por sensações, novo viandante, adentre.
Agora, como antes, a jovem repousa. Não está tranqüila, está ansiosa, nervosa, indecorosa... Assanhada. Assanhada, nova peregrina, a jovem pensa nos olhos firmes, no delinear de corpos masculinos vultosos. Suspiros. A jovem sente a pele arder, o calor vem de dentro, sabemos bem, no pensamento ela saboreia lascívia. Sem regras. Nos sonhos, longe das normas, ela não é vulgar, não quebra voto, apenas... Calor... Apenas o calor, o prazer, sensações... As mãos em movimento, os lábios, frenesi, um arrepio percorre o corpo. Ela acorda.

Face oculta, sutil, leve como brisa, caminha pela penumbra.
No quarto escuro, barroco, o ancião adormece. É educado, gentil com as crianças, honesto... Verdade? Mentira.
O ancião não dorme em paz. O ancião pensa nos rostos, nas ações, ele conhece o próprio passado e sente a imundícia da vida. Inoculo por sensações. O ancião pensa nas mortes, nos gritos, no pavor... Eram jovens, somente jovens... Cumprir o dever, ele cumpriu o dever. Homem da Lei. Agora, como paga, uivo dos mortos. Escravos do medo, vítreos e brilhantes olhos na escuridão. Amanhã, um ato nobre, um belo presente para o neto... Sorriso mordaz, olhar nefando, ele segue...

Face oculta, sutil, leve como brisa, caminha pela penumbra.

Nenhum comentário: