terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Prelúdio de refutação

"Mas como pode ser? Como pode ser que eu que o digo, vós que o ouvis, e todos os que vivemos sejamos já pó: Pulvis es? A razão é esta. O homem, em qualquer estado que esteja, é certo que foi pó, e há de tornar a ser pó. Foi pó, e há de tornar a ser pó? Logo é pó. Porque tudo o que vive nesta vida, não é o que é: é o que foi e o que há de ser. Ora vede".

(Antônio Vieira, Sermão de quarta-feita de cinza)


Eu não sou Chico Xavier.

Perambulando de um lado para o outro, entrei certa feita em uma livraria. Iluminado lugar em tom bege, com gente gentil avaliando capas: livros espíritas, romances de gramáticas, puerilidades de espíritos rasos; gente que se angustia tricotando bebedeiras, gente angustiada filosofando entre uma lamúria e outra lamúria. Diabos, estou falando da suma do psicodelismo não estou? Li cinco ou seis livros na vida, esqueci o teor de quatro e de um outro não lembro o título.

Serei escritor.

O caso é que não me reconheço em tudo isso. Vejo um bege opaco, ofuscado por tênue capa acinzentada, esfumaçada, rabeira entre Ser e Não-Ser. Sem questão. Meramente, penso ter coisas para dizer, e que estão longínquas de quaisquer verossimilhanças usuais - e não falaria em singelos contos de fadas:

Relaciono-me com espíritos.

Ecos de restos, arabescos liames, funestos proclames de morte! Macabros sortilégios, velas e sapos! Terrível? Hilário! Não, monótono... Vapores de gentes saudosos e meditabundos, canhestros, e traiçoeiros quase todos, e alguns poucos interessantes. Alguns poucos, temerários dos quais tudo é insuficiente temer. Alguns são sábios. Vários apáticos outros tantos indiferentes ou complacentes. Não se diferenciam dos vivos.

Perambulam pelas penumbras do mundo. Eu com eles. Alastrando suas personalidades em névoas pelos meus agudos sentidos. Posso vê-los, tocá-los, ouvi-los, falar com eles, e ficar aborrecido com os seus aborrecimentos. Sou a superficialidade militando em profundos.

E assim transcorrem meus dias, dentre espíritos e mentes mortas, conscientes de si, consciente no meu Eu. E não é outro o meu tema aqui.

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