quarta-feira, 4 de maio de 2011

Realidades inusitadas


"Eu não faria isso, calma".


Sempre ouvi do senhor meu avô, de ventura detetive: "Não dê tempo de reserva". Queria dizer; quando atacar o feito, faça de viés definido. Titubeio, sim-não, sem-razões de hesitar, quase sempre são prelúdios de fatalidade, perda, ou mesmo morte.

Mas ele estava mesmo entusiasmado. As pessoas realmente pensam que no improviso acertado é e basta o extraviar. Sair do comum. Vezes há até no sair do comum o comum da coisa, e nem sempre sair do comum é mudar, e mudar, por mudar, nem sempre é algo além do mesmo. Todo baterista conhece essas verdades nos pulsos. É como o sujeito que joga um pincel lamacento no quadro e chama de "arte". Ampliando a imagem de consciência.

Faço rodeios como se vê, pois o assunto é delicado. Todos sabiam do comportamento alegre de Aldonça - Valha-me o Diabo um nome assim! - suas saidas, seus sorrisos, brincadeiras desapropriadas. Em roupas e falas e nas experiências de seus afetos era assim uma deleitável de confiança. Vulgar não seria nunca uma palavra justa. Ela estava satisfeita naquela promiscuidade de escolha. Uma vaga de emoções flutuantes distantes de instintos e razões. Uma patrícia romana em sua simplicidade...

Quem acreditaria que ele sujeito casto aconteceria?

Quero dizer; ele não se apaixonou mesmo pela figura? E ela, não correspondeu? Não namoraram? Seria possível. Teimei em acreditar. Ela viu algum truão cobiçoso em sua simpleza sexual, ou foi algo mais profundo? E meu amigo que agora fala tanto em suas desconfianças que bem sei acertadíssimas, não foi capaz de perceber sua volúvel Capitu?

Um Sancho Pança e Capitu. É como vejo com meu olhar criticista. Ou coisa que o valha com mais sabor.

Parece que falo de dias ou meses. Não. Anos. Meu bom Pança viveu no mesmo teto de sua profana casta. Terminado o encantamento? Fala assim - vejo o olhar nervo e questiono comigo - quer descobrir os segredos de sua Pequena.

Eu não vou meter colher.

Fala de descobrir, revelar. Será possível?! Espera mais alguma palavra de abrandamento, um consolo, um alívio, uma advertência. Finjo trastulo tudo ignorar. Implora em seus gritos por uma prova de negação. Suspira em benefício do tempo. "Esquecer, tudo será como antes". Um antes que efetivamente nunca existiu.

Exaspera, levanta, segue determinado. Diz estar armado. Duvido muito. Ele não aparecerá no Motel. Ele sabe, ela sabe, nosso outro amigo com ela sabe. Intimamente. Dormirá, estaremos amanhã no serviço, falaremos de futebol. Não; ele sabia, e prefere o doce sabor da ilusão por escolha consciente.

Um mundo engraçadíssimo, o nosso.

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